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Eu estava casada há pouco tempo. Nunca havia saído de casa, a não ser agora, para morar no apartamento do meu marido, em uma cidade próxima da capital. Tinha o meu trabalho, que me tomava o tempo todo. Lecionava em uma grande escola de nível médio e apesar do pouco tempo na escola, já fizera algumas amizades. Mas em casa, ficava sempre sozinha...ou quase. Uma noite, enquanto lavava a louça na cozinha, meu pensamento me conduziu para muito distante dali. Perdia-me em pensamentos, como sempre fazia. Não conseguia me concentrar numa coisa só. Sempre fora assim. Estava num lugar, mas sempre imaginando estar em outro. Nessa noite, estava tão distraída que cheguei a me assustar, quando senti um leve toque em meu ombro. Virei-me rapidamente, imaginando que fosse Luiz Carlos, meu marido, querendo me fazer uma surpresa. Surpreendi-me, quando não vi ninguém. Olhei novamente ao redor, mas não avistei nada. Mas aquela estranha sensação continuava a me impressionar. Sentia nitidamente aquela mão tocando o meu ombro, como se quisesse me chamar a atenção ou me falar alguma coisa. Outra vez, tive essa mesma sensação. Essas coisas aconteciam sempre que eu me encontrava sozinha, em silêncio e duas vezes eu estava na cozinha, de costas para a porta. Algumas vezes, sentia a presença de alguém ao meu lado. Virei-me rapidamente, e só vi um vulto passando rápido, para lugar nenhum. Essas estranhas sensações vinham acontecendo já há vários anos. Quando ainda era adolescente, perdera o meu irmão mais velho, de maneira que muita dor me causara. E a dor não era fictícia, era real, mesmo. Lembrava-se nitidamente desse dia. Estava na varanda da casa, conversando com o irmão, quando ele sofreu o primeiro infarto. Tinha só dezoito anos, mas sofria de uma doença cardíaca desde que nascera. Meus pais e irmãos sabiam, alertados pelo médico, de que ele não viveria muito tempo. E assim aconteceu. Um dia eu estava conversando com ele, quando ele perdeu os sentidos. Fiquei impressionada e sem saber o que fazer, gritei para a mãe e corremos atrás de socorro. Meu irmão foi conduzido ao hospital. No outro dia, pela manhã, eu estava em frente ao espelho, no quarto da mãe, reunindo algumas coisas para enviar para o hospital, quando sentiu um frio que me penetrou até os ossos. Olhei o relógio do meu irmão e percebi que ele estava marcando onze horas. Poucos minutos depois, tocaram a campainha e a notícia de que o irmão havia falecido me deixou sem saber o que pensar. Nunca havia perdido ninguém e não sabia definir aquela sensação que estava sentindo. Era muito apegada a esse irmão e isso me impressionou muito. Pouco tempo depois desse dia, eu começei a sentir um estranho aperto no peito, igual aquela dor que o meu irmão sentira, quando teve o ataque cardíaco. Já não sabendo mais o que fazer, um dia não suportei mais a dor e desmaiei, da mesma forma como havia acontecido com o meu irmão. Fiquei mais impressionada ainda, pois nunca havia desmaiado. Só voltei a mim, quando a mãe me puxou pelos braços e o meu tornozelo se feriu ao ser arrastada até a cama. A mãe me levou ao médico e ficou constatado que tudo era psicológico. Com o tempo, eu esqueceria e tudo voltaria à minha rotina habitual. Só que os anos se passaram e aquela estranha sensação que oprimia o meu peito acontecia novamente, sempre no mês de abril, mês em que o meu irmão havia falecido. Lembrava-me disso agora, ali, naquele momento. Procurei pela minha irmã, que já tinha conhecimento dessas estranhas sensações e ela me convidou a ir até a sua cidade, onde procuramos por uma pessoa que conseguia psicografar mensagens espirituais. Na carta que eu recebi do meu irmão, datada daquele mesmo dia em que ele partira, estava a sua mensagem de adeus. Uma mensagem linda, em que o meu irmão dizia que me amava e desejava que eu fosse muito feliz. Dizia ainda, que seria meu anjo protetor. Quando quisesse falar com ele, não o procurasse na terra, porque na terra eu só encontraria os vestígios de que um dia ele estivera ali. Mas que mantivesse a calma e procurasse ouvir o silêncio, que ele lá estaria a me escutar. E assim aconteceu. A dor que eu sentia, nunca mais me incomodou.
Débora Benvenuti
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